Com o propósito de incentivar a educação pela paz, respeitando sempre os direitos humanos e da justiça. Este, por exemplo, era um pensamento do pacifista Mahatma Gandhi (1869-1948). E foi em homenagem a ele que surgiu o Dia Internacional da Não-Violência, comemorado anualmente em 2 de outubro.
De acordo com relatório apresentado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, no final do ano passado, cerca de 65 mil mortes no país ocorrem por conta da violência. É muita gente! Em termos de comparação, os Estados Unidos, por exemplo, perderam 58 mil soldados durante toda a sangrenta guerra do Vietnam.
No estado do Rio de Janeiro são registrados mais de 600 casos por ano, com dezenas de crianças engrossando esta estatística.
Números que representam vidas perdidas, mutilações e famílias inteiras condenadas, acima de tudo, à tristeza do luto que não esmorece e nem dá trégua ao coração.
Afinal, a maior dor existente no mundo é a dor da perda. Quando se perde um alguém que se ama muito e, em especial, se esse ente querido é jovem e tinha “tanta vida pela frente”, sofremos ainda mais.
Nos castiga fundo na alma a imensa falta de sentido, que carrega a infinita dor traduzida no ato de uma mãe ver enterrar sua criança. Apenas quem passou por isso entende ao que chamamos de “dor de todas as dores”.
Enquanto isso, quantas crianças e jovens enterraram suas esperanças, seus potenciais e seus sonhos de futuro por conta da violência, que é tanta a ponto de parecer que nosso país decidiu por banalizar as mortes e o sofrimento daqueles que ficam marcados pelo resto de suas vidas.
Em suma, a notícia aparece no jornal e simplesmente se desvia o olhar para outro canto da página e o pensamento se distancia…
O poeta Fernando Pessoa dizia “isso acontece a tanta gente que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece”.
As tragédias que acontecem diariamente, em maior número na vida da população mais humilde, em especial nos grandes centros urbanos, deixaram até de merecer destaque nas redes sociais ou nos meios de comunicação.
Refiro-me tanto a morte da menina Ágatha Félix, de oito anos, morta com um tiro de fuzil, como a daquele assassino frio, que despreza a vida de um ser humano e que merece sim todo o rigor e peso da lei.
Dessa forma, importante lembrarmos das vítimas absolutamente inocentes das chamadas balas perdidas, oriundas de rajadas disparadas a esmo ou no calor do combate. Essa tragédia brasileira passou a ser encarada por tantos como parte da nossa realidade ou até de nossa cultura.
Não defendo bandido. Deixo isso absolutamente claro. Ao contrário, acho que a polícia precisa agir com toda a força necessária e enfrentar o crime em todos os níveis.
No entanto o caminho da força sem inteligência traz resultados terríveis ao custo de vidas inocentes e de desperdício do dinheiro público.
É fundamental combatermos o mal pela raiz, colocar na cadeia os financiadores da importação das drogas e das armas para abastecer os criminosos, que em parte estão nas favelas e, ao que parece, são os únicos que merecem a atenção das autoridades.
Por outro lado, também acredito que responsabilizar os policiais pela violência é tão injusto quanto culpar os professores pela situação da educação, ou os médicos pelo desempenho dos hospitais da rede pública.
O confronto entre modernos fuzis traz a possibilidade real de aumentar, catastroficamente, o volume de balas disparadas atravessando as residências, postos de saúde, hospitais, escolas, ônibus e carros, estraçalhando quem quer que esteja no caminho.
Tentem se imaginar, por exemplo, com suas famílias, dentro de uma casa de madeira ou de tijolos sem reboco, situada num bairro pobre, durante noites seguidas, com quatro crianças chorando desesperadas, abraçadas a outros familiares em pânico, em meio a um tiroteio, onde ninguém, absolutamente ninguém, está a salvo.
Essas pessoas vivem a vida alternando o terror ao luto, são submetidas a poderes paralelos de “governos” comandados por bandidos que os oprimem, abusam e os exploram a todo o tempo. E isso precisa ser levado em consideração neste debate.
Já passou da hora do Brasil apresentar medidas de impacto para enfrentar a violência, não há o que questionar neste sentido. A população deixou isto bem claro nas urnas.
No entanto, na minha opinião, essas ações não podem se limitar a mudanças na lei, que se apresentam de forma isolada, desacompanhada de um conjunto de ações estratégicas de governo que ataquem as origens do problema. A pacificação das comunidades situadas no Rio de Janeiro fracassou exatamente por esta razão, não é mesmo?
Estou me referindo à instalação de mais escolas de ensino profissionalizante em todos os níveis e ao financiamento do micro empreendedorismo. Da mesma forma, fazendo incubadoras de empresas, gerando oportunidades para acolher nossa juventude.
Além disso, entendo que os governos podem e devem fazer os órgãos de governo responsáveis pela educação, cultura, assistência social, saúde, trabalho e desenvolvimento econômico, se organizarem para apresentar um projeto integrado e se articulando com as cidades, e os governos dos estados.
E não podemos esquecer da valorização dos policiais o investimento em tecnologia, e em qualificar cada vez mais nossos agentes de segurança pública! Não são questões igualmente urgentes e necessárias?
E a questão de como financiar um projeto de segurança é sempre o nó que se apresenta para nos aprisionar e não ter solução.
O Estado perdeu grande parte de sua capacidade financeira de investimento, principalmente nos últimos anos em virtude da grave crise fiscal pela qual atravessa.
O meu Estado do Rio de Janeiro é o maior exemplo de que a falta de investimentos, não só em segurança, mas em políticas públicas, certamente, tornou cidadãos de bem reféns e policiais vulneráveis.
Dessa maneira, apresentei o Projeto de Lei 5113/2019, que cria o “Programa Nacional de Assistência à Segurança Pública e à Prevenção de Crimes”. O projeto concede incentivos fiscais a doação e patrocínio para projetos relacionados à segurança pública.
Antes mesmo de ser protocolado na Câmara dos Deputados, apresentei a ideia deste Projeto ao ministro Sergio Moro, que aquiesceu favoravelmente com os termos.
Semelhança com Lei Rouanet
O caminho usa da mesma forma a lógica de outros planos de incentivo, como a Lei Rouanet. Ou seja, ele visa estabelecer métodos de arrecadação de recursos para complementar o orçamento e o financiamento da segurança pública alocando recursos destinados ao custeio e ao investimento com foco nas áreas de prevenção à violência, investigação, inteligência, preservação da ordem pública, perícia criminal e ressocialização de apenados.
A captação desses recursos será feita entre pessoas físicas ou jurídicas que poderão, portanto, aplicar parte do imposto de renda devido em propostas sistemicamente organizadas com o firme propósito de melhoria da segurança pública no País.
Em conclusão, simplificando: a pessoa física ou jurídica poderá aplicar parte de impostos devido em projetos de segurança pública organizados e geridos por autoridades de segurança no âmbito federal (Conselho Gestor a ser criado).
Sem uma política pública de curto, médio e longo prazo corremos risco de estarmos, como se diz, “enxugando gelo”, onde cada gota de água representa a vida de um brasileiro que se esvai e uma família que se estilhaça. Dessa forma, não é possível decidirmos sobre esta matéria tão somente pela emoção, ou tratar o tema de forma simplista e muito menos de afogadilho.
E a Nação, acima de tudo, que não valoriza a vida de seu povo, os representantes que não tiverem a necessária cautela diante de medidas extremas, irão responder com suas consciências pelas mortes de inocentes.
E deste peso, ninguém se liberta.
Além disso, o sentimento de culpa, se errarmos em nossas decisões, nos acompanhará por toda a vida, e só será inferior a dor das famílias que serão destruídas.
Portanto, creio que devemos fazer um esforço coletivo no sentido de buscarmos soluções tangíveis, que de fato sejam eficazes e não só midiáticas.
Esse projeto de lei visa, acima de tudo, apoio a medidas emergenciais e também ao planejamento de uma verdadeira política de segurança que vise um objetivo maior que é a conquista da paz.